The Conjuring (2016)

The Conjuring (2016)
Título original: The Conjuring 2
Título nacional: Invocação do Mal 2
Gênero: Terror
Duração: 2h 15min.
Ano de lançamento: 2016
Diretor: James Wan
Roteiristas: Carey Hayes, Chad Hayes
Elenco: Vera Farmiga, Patrick Wilson, Madison Wolfe
Sinopse: Sete anos após os eventos de Invocação do Mal (2013), Lorraine (Vera Farmiga) e Ed Warren (Patrick Wilson) desembarcam na Inglaterra para ajudar uma família atormentada por uma manifestação poltergeist na filha. A trama é baseada no caso Enfield Poltergeist, registrado no final da década de 1970.
O trabalho de um roteirista não é nada fácil, menos ainda daqueles que se propõem a trabalhar com adaptações, seja ela de outros meios narrativos ou de acontecimentos da vida real. Porém, nesse quesito, há alguns facilitadores que tornam o trabalho dessas pessoas menos ingrato. Como por exemplo, as diversas histórias reais que, por si só, já seriam ótimos roteiros. Assim é o caso do Poltergeist de Enfield, como ficaram conhecidos os acontecimentos que originaram a história contada em “Invocação do Mal 2” (The Conjuring 2, 2016), novo filme do promissor diretor James Wan.
O roteiro é assinado por Carey e Chad Hayes, que retornam depois do excelente trabalho em “Invocação do Mal” (The Conjuring, 2013). Porém, a diferença, nesse caso, é o material disponível para a produção desse roteiro. O Poltergeist de Enfield, caso do final dos anos 70, é o mais documentado caso sobrenatural de todos os tempos. Somado a isso, ainda há todas as dúvidas e incertezas que circundam esses acontecimentos. Fórmula perfeita para um ótimo roteiro de terror, certo? Bem, não é exatamente assim em “Invocação do Mal 2”.
A trama, baseada em acontecimentos reais, acompanha a família Hodgson, que é atormentada por situações sobrenaturais. Situações essas que vão se intensificando, até levar a família a buscar ajuda externa, com vizinhos, polícia e, posteriormente, especialistas da área sobrenatural. O centro desses acontecimentos é a irmã mais nova, Janet (Madison Wolfe), que é possuída pela entidade maligna e usada como uma forma de comunicação com os vivos. Seus irmãos, porém, também sofrem com os acontecimentos. Até a mãe, Peggy (Frances O’Connor) é rapidamente convencida de que algo estranho realmente está acontecendo em sua casa. Essa é uma subversão interessante, pois quebra um clichê do gênero e cria uma dinâmica em que toda a família permanece unida e ciente da situação desde o início do filme. Um dos (não muitos) pontos positivos do roteiro.
Sendo ainda positivo com o roteiro, é importantíssima e muito bem colocada a cena no meio do longa que mostra Ed Warren (Patrick Wilson) com um violão tocando Can’t Help Falling In Love, de Elvis Presley, para os Hodgson, com o objetivo de transparecer normalidade à família. A cena desacelera o ritmo frenético de susto atrás de susto, deixando espaço para o espectador respirar, além de criar maior expectativa para o próximo acontecimento. E ainda, a escolha da música é acertadíssima para narrar o arco dramático que envolve o casal Warren. Não aprofundarei sobre o tema para não dar spoiler, mas o encaixe é perfeito.
Entretanto, o que mais me chamou atenção no roteiro foram algumas escolhas no rumo que a trama segue. Quem já leu um pouco sobre o caso sabe que há uma vertente cética que acredita que as duas irmãs tramaram a coisa toda com ajuda da mãe para lucrar com publicidade. Porém, esse aspecto – mesmo sendo importantíssimo para história – é quase que completamente ignorado pelos roteiristas. Não há ambiguidade nenhuma na trama. Desde a primeira cena, sabemos que a história ali narrada é sim de cunho sobrenatural. Portanto, não há porque se debruçar no aspecto investigativo da narrativa. “A Invocação do Mal 2” não possui tons de cinza, é um filme extremamente preto no branco, e isso – definitivamente – não é um ponto positivo para filmes de terror. Tome “A Bruxa” (The Witch, 2016) como exemplo, talvez o terror mais genuinamente assustador e completo dos últimos anos, é inteiramente pautado na dúvida, na incerteza, e na ambiguidade. E é isso o que o tornou um clássico instantâneo do gênero.
Uma saída para “A Invocação do Mal 2” se sair melhor nesse quesito, talvez seria mudar o foco narrativo dos Hodgson para os Warren, explorando mais o aspecto investigativo e pontuando o terror progressivamente no caminhar da trama, mas sempre mantendo a ambiguidade. Anita Gregory, interpretada Franka Potente, ganharia mais destaque no filme representando o olhar cético da história, contraponto o olhar dos Hodgson.
Outro aspecto do roteiro que merece atenção, é o fato de que, na realidade, os Warren não tiveram um papel de protagonismo nesse caso. Quem liderou as investigações foram Maurice Grosse (Simon McBurney) ao lado de Guy Lyon Playfair, que, recentemente, alegou em uma entrevista que os Warren foram apenas uma vez à casa dos Hodgson e que Ed o disse que eles poderiam lucrar muito com aquele caso (link). É importante ressaltar também que Playfair teve um papel de grande importância no caso de Enfield, sendo ele o autor do livro mais importante sobre esses acontecimentos, o “This House is Haunted: The True Story of the Enfield Poltergeist” de 1980.
Eu sei que, por ser uma adaptação, alguns aspectos do que realmente aconteceu precisam ser alterados em prol da narrativa, porém, o que se passa em “Invocação do Mal 2” é um caso político que envolve direitos de imagem. O Poltergeist de Enfield era um caso o qual o estúdio possuía os direitos, então, na lógica deles, porque não criar uma franquia de um filme que obteve grande sucesso de bilheteria no passado? O problema dessa lógica é que o filme retrata pessoas reais, portanto, vejo como antiético ocultar estudiosos que realmente trabalharam no caso, transferindo toda a glória para pessoas que, segundo aqueles que realmente estavam envolvidos, apareceram no local com apenas a ideia de obter lucro em mente. Pensando bem, a lógica do estúdio está correta. Vamos lucrar glorificando pessoas que pensam no lucro, ser coerente com os créditos pessoais para que? Isso não vende. Não pense nisso… olhe para lá! É a Anabelle!
Enfim, deixando de lado esse aspecto da discussão e voltando a análise do filme, sendo um pouco menos ranzinza, a direção de arte merece palmas. A casa, por si só, causa medo. A cabana de Billy no fundo do corretor, colocada de frente para o quarto dos meninos é algo aterrorizante, que lembra um pouco a cena da cabana de “O Sexto Sentido”. Ainda nessa competência, destaco a cena em que Janet assiste televisão na sala. À primeira vista, há um sentimento de conforto, a cena chega a ser aconchegante devido a paleta pouco saturada, o som da chuva, e, principalmente, a disposição espacial dos objetos na tela. Tudo é orquestrado perfeitamente para que o espectador se sinta à vontade no princípio da cena, para que esse sentimento seja desconstruído aos poucos no decorrer da mesma. Há também um detalhe interessante na sequência em que Lorraine (Farmiga) enfrenta o espírito do quadro. No cenário é possível notar uma pintura do que parece ser o pôster do primeiro filme, esse detalhe, mesmo que singelo, dá um senso de continuidade ao filme.
Mas para ser honesto, todo o primeiro ato é orquestrado magistralmente. Até osjumpscares, artifício que não me agrada muito, são usados na hora certa acrescentando horror à projeção. É perceptível o cuidado com a construção do suspense. Wan, para isso, faz uso de planos mais longos, incluindo um excelente plano sequência da rotina dos moradores logo no início, o que sugere que algo segue a família dentro de casa. Ideia semelhante à de Peter Medak em “A Troca” (The Changeling, 1980) que usa muito de planos longos e abertos sugerindo que há alguma coisa à espreita. “A Troca”, inclusive, parece que foi uma das grandes influências para James Wan aqui. Há outra cena, envolvendo Lorraine e um bíblia, que remete, também, ao filme de 1980.
Outro ponto que precisa ser visto é a trilha sonora. Há um problema no excesso do uso dessa técnica em “Invocação do Mal 2”. Em determinado momento da projeção, a trilha passa a trabalhar contra o clima construído em cena, dando dicas ao espectador quando o jumpscare entrará. A linguagem adotada por Wan prevê quando haverá um susto, pois, a trilha sempre começa devagar e vai subindo progressivamente até atingir um clímax para depois ser bruscamente cortada. Em meio ao silencio da cena, aparece alguma figura sobrenatural, e a trilha volta mais alta ainda, com o objetivo de potencializar o susto. Porém, essa técnica, quando usada exaustivamente como foi em “Invocação do Mal 2”, passa a ser extremamente irritante para quem está assistindo. O espectador não mais tem medo do clima e da trama, e passa a temer quando tomará o próximo susto não-diegético. Na minha concepção, quanto mais um filme de terror conseguir usufruir da diegese sem recorrer a elementos externos, melhor.
Relacionado a isso, existe outro problema sério, que é a ultra exposição dos fantasmas. Isso quebra a expectativa, o filme é saturado de aparições, deixando pouco espaço para sugestão e para ambiguidade, anteriormente discutida. Sinto que “Invocação do Mal 2” ganharia mais tivesse tido umas aulinhas sobre o assunto com “Cloverfield – Monstro” (Cloverfield, 2008).
Enfim, “Invocação do Mal 2” é um filme que possui mais pontos negativos do que positivos, porém, não é, nem de longe, um filme ruim. Os acertos merecem ser destacados, principalmente aqueles no primeiro ato. Entretanto, o sentimento que fica é que, com o que tinham em mãos, os realizadores poderiam ter entregado um produto bem superior ao que foi apresentado.